Já se deve ter perguntado sobre o que representam os laços azuis que estão espalhados por várias escolas e instituições de Guimarães. Talvez saiba ou talvez não que simbolizam as nódoas negras que marcam os corpos de crianças vitimas de maus tratos. Abril é o mês escolhido para assinalar a importância de prevenir situações de violência física, psicológica ou sexual na infância e Guimarães, todos os anos, participa na Campanha Laço Azul.
A americana Bonnie W. Finney iniciou o movimento “Laço Azul” depois de saber que os netos eram vítimas de maus-tratos por parte dos pais. Perante a impotência da avó, o neto mais velho foi brutalmente assassinado e a neta de 16 meses foi parar ao hospital com ferimentos graves, entre eles a perna partida em quatro sítios. O luto desta avó e o laço que decidiu atar à antena do carro, que começou em 1989, na Virgínia, nos Estados Unidos da América, deram a volta ao mundo para despertar a população em relação aos maus-tratos contra as crianças e para envolver as comunidades na prevenção, promoção e proteção dos seus direitos.
Todas as formas de lesão física ou psicológica, abuso sexual, negligência ou tratamento negligente, exploração comercial ou outro tipo de exploração são, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), abusos ou maus-tratos que devem ser denunciados por qualquer pessoa. A responsabilidade é de todos e todas e abril, enquanto Mês Internacional de Prevenção dos Maus-Tratos na Infância, representa os esforços que devem ser assumidos para evitar qualquer contexto de maus-tratos às crianças.
A Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Guimarães associa-se, novamente, em 2022, a esta iniciativa através da promoção de um conjunto de ações inscritas na “Campanha Laço Azul”. “Esta campanha realizada em colaboração com a Câmara Municipal de Guimarães e entidades concelhias da área da infância e juventude, tem como primeiro propósito atrair a atenção e sensibilizar a comunidade para a problemática dos maus-tratos na infância, resultando, assim, na prevenção dos maus-tratos contra crianças e jovens e na promoção do seu direito ao respeito e ao afeto”, sublinha a presidente da CPCJ de Guimarães, Marta Pinto.
A sessão de lançamento da campanha contou ainda com a participação dos clientes da Cercigui, dos alunos do Patronato de Nossa Senhora da Oliveira, do presidente da câmara municipal, Domingos Bragança, da eurodeputada, Isabel Estrada Carvalhais e do presidente da CERCIGUI, Bruno Faria.
No âmbito da campanha de Prevenção dos Maus-tratos na Infância, a decorrer este mês, além da colocação de laços azuis nas fachadas de vários edifícios, merece destaque a intervenção artística em algumas árvores localizadas nos espaços envolventes aos estabelecimentos de ensino, educação e formação e outras organizações sociais, com elementos alusivos à campanha. O edifício da Câmara Municipal de Guimarães está iluminado com luz de cor azul e tem vindo a ser divulgado em outdoors e muppies dispersos pelo concelho o slogan da campanha, “Serei o que me deres…que seja AMOR”. “Stop aos Maus-tratos na infância” é outra das ações realizadas que envolve os agrupamentos de escolas e as forças de segurança: esta iniciativa através de uma ação de Stop aos automobilistas, sensibiliza os condutores para a prevenção dos maus-tratos na infância. Marta Pinto destaca ainda a exposição artística “Manto dos Direitos das Crianças” patente nas instalações da CPCJ, , realizado pelas crianças da educação pré-escolar e 1.º ciclo do Agrupamento de Escolas Vale de São Torcato.
As entidades de primeira linha, como é o caso das escolas e todas as instituições que trabalham diretamente com as crianças devem estar atentas e sempre que necessário, articular com a Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) de forma a remover o perigo em que as crianças ou jovens se encontram. Marta Pinto diz que o organismo a que preside “intervém ao nível da sua modalidade alargada, vocacionada para desenvolver ações de âmbito geral de promoção dos direitos e de prevenção das situações de perigo, e ao nível da sua modalidade restrita com competência para intervir nas situações concretas em que uma criança ou jovem está em perigo.
O número de processos novos instaurados ou reabertos pela CPCJ de Guimarães em 2021, aumentou em 25% em relação a 2020, o que a juntar aos processos transitados desse ano, somou 705 processos em acompanhamento ao longo do ano.O relatório de avaliação de 2021 da CPCJ de Guimarães demonstra que as sinalizações por maus-tratos físicos aumentaram, com destaque na faixa etária dos 6 aos 8 anos. Em relação às sinalizações por Comissão Social Interfreguesias este organismo revela que, em termos absolutos, verificou-se uma variação significativa de sinalizações por CSIF relativamente a 2020: aumentando as comunicações de famílias residentes na CSIF de Couros e Castreja e diminuindo na CSIF do Oeste. “As situações de maus-tratos físicos, pelo menos as que são comunicadas à CPCJ de Guimarães, não são muito recorrentes mas ainda assim aumentaram relativamente ao ano anterior. Porém a violência intrafamiliar é uma realidade cada vez maior e, naturalmente, o maltrato psicológico ou violência psicológica sobre as crianças é uma consequência inegável e com prejuízos enormes para a saúde física e mental das crianças e jovens”, refere Marta Pinto.
Também as comunicações por violência doméstica aumentaram em 37%, passando a ser as forças de segurança a entidade que mais sinaliza à CPCJ ao contrário do que habitualmente sucedia, em que eram os estabelecimentos de ensino a entidade com maior número de comunicações à CPCJ.
O facto das crianças dos 0 aos 5 anos terem sido as mais expostas às situações de violência doméstica é um dado que não pode ser descurado. “Acredito que existem fatores protetores que podem ser decisivos para que uma criança maltratada ou negligenciada possa ser um adulto equilibrado e seguro”, começa por referir Marta Pinto. “No entanto as crianças que vivenciam situações de maltrato ou negligencia, potencialmente serão adultos com maiores vulnerabilidades sociais, familiares, psicológicas e emocionais”, remata a presidente da CPCJ de Guimarães.
Nesse sentido a CPCJ é uma entidade “crucial” para a proteção de crianças e jovens que conta com a participação dos principais agentes da comunidade para, através de uma relação próxima, ativa e dinâmica, resolver as situações em que, eventualmente, uma criança ou jovem possa estar em perigo.
Esta articulação de esforços foi determinante para ultrapassar os desafios impostos na pandemia e garantir que a comunidade protegia os direitos das crianças durante os confinamentos. “Esta foi, talvez, a principal força da CPCJ de Guimarães que se manteve sempre atenta, disponível e coordenada, embora a fragilidade do vínculo de alguns elementos à CPCJ e a consequente pouca disponibilidade, se tenham evidenciado nesta altura”, revelou Marta Pinto. “O contexto de pandemia resultou em maior número de comunicações à CPCJ e situações de maior complexidade e gravidade”, admitiu.
Outros resultados importantes do relatório de avaliação de 2021 foram as comunicações por absentismo escolar, que apresentaram um aumento de 55%, atingindo sobretudo os jovens a partir dos 15 anos. Além disso, foram os jovens dos 11 aos 14 anos aqueles que mais assumiram comportamentos que afetaram o seu bem-estar e desenvolvimento, delinquência, comportamentos auto-lesivos, consumo de álcool ou estupefacientes, faixa etária que diminui relativamente a 2020 e 2019, anos em que eram os jovens dos 15 aos 17 anos os que mais apresentavam este tipo de comportamento.Marta Pinto em discurso direto...
Guimarães, Cidade Amiga das Crianças (GCAC) - Quem é Marta Pinto?
Marta Pinto (MP) - Uma pessoa vulgar, mãe, filha, profissional, emotiva e focada nas relações familiares e relações com todos com quem me cruzo.
GCAC - O que a move?
MP - As pessoas, as emoções, o sentido de justiça, igualdade e proteção.
GCAC - Em termos profissionais, como foi o percurso até chegar a responsável pela delegação de Guimarães da CPCJ?
MP - Desde sempre trabalhei na área da intervenção social, concretamente coordenava um projeto de intervenção junto de crianças, jovens e famílias residentes em territórios de maior vulnerabilidade social e económica.
GCAC - Na sua opinião, qual é a importância desta iniciativa da UNICEF?
MP - Considero que a apropriação desta iniciativa pelos Municípios é por si só um sinal de responsabilidade social e de investimento na promoção dos Direitos das Crianças. Guimarães tem assumido este desafio com enorme compromisso.