Carlos Ribeiro é o diretor executivo do Laboratório da Paisagem e coordenador do Eixo III do Território e Ambiente do plano de ação local do programa “Guimarães, Cidades Amigas das Crianças”. Licenciado em Biologia, com mestrado em Biologia Molecular e com um doutoramento em Ciências Biomédicas, Carlos Ribeiro reconhece, ao longo de toda esta entrevista, a importância das crianças para a consciencialização ambiental e para a aposta no desenvolvimento sustentável.
Guimarães, Cidade Amiga das Crianças (GCAC) - Quem é Carlos Ribeiro?
Carlos Ribeiro (CR) - É sempre muito complicado definirmo-nos. Prefiro sempre que outros o façam. Ainda assim, diria que sou um vimaranense orgulhoso, apaixonado pelo que faço e com vontade de fazer sempre mais. Uma pessoa tranquila, mas exigente, essencialmente comigo.
GCAC) - O que o move?
CR - Contribuir com o que sei e com o que posso, para ajudar a construir um futuro melhor para os que nos rodeiam, seja de forma direta ou indireta. Mas, acima de tudo, sou movido por valores, aqueles com que fui educado e com que cresci. Os valores do respeito, da solidariedade, da autenticidade, da dedicação e do profissionalismo, que são, para mim, inegociáveis.
GCAC - Esta entrevista é motivada pelo facto de ser o coordenador do eixo Território e Ambiente do plano local do programa Guimarães, Cidade Amiga das Crianças: o Carlos, em criança, já era um miúdo com sensibilidade para as questões do ambiente e com um cuidado e interesse pela natureza?
CR - Diria que sim, mas provavelmente não tanto como quero acreditar que as novas gerações têm condições para o ser. Hoje, felizmente, a quantidade de informação que lhes chega e a preocupação acrescida sobre o impacte das nossas ações diárias e a importância de invertermos o nosso caminho, torna-os mais preparados. Seja como for, sim, sempre fui um miúdo com muito interesse pela natureza, pelas ciências e pelo que me rodeava.
GCAC - Quando é que a vontade de seguir Biologia se começou a manifestar?
CR - A verdade é que acho que, felizmente, e até por ser bom aluno, sempre tive alguma dificuldade em dizer “é mesmo isto que quero seguir”. Sem falsa modéstia, acho que achava que me daria bem em várias profissões. Tinha um gosto especial pela área da comunicação e das ciências. Ainda assim, na altura quando entrei no secundário optei pela então denominada área de científico-natural, pela paixão pela ciência, pela descoberta, pela investigação, pelos laboratórios. Devo dizer que este gosto crescente também o devo a alguns professores com que me fui cruzando, nomeadamente na Escola Secundária Martins Sarmento, onde estudei.
GCAC - Como foi o percurso profissional até chegar a diretor executivo do Laboratório da Paisagem?
CR - Após terminar o curso de Biologia Aplicada na Universidade do Minho, senti necessidade de continuar a estudar e a evoluir na carreira. Daí a opção por realizar primeiro o mestrado, ainda na Universidade do Minho, e depois o doutoramento pela Universidade do Porto. Antes de me ter sido lançado o desafio para assumir a direção do Laboratório da Paisagem, em 2015, fui investigador, durante sete anos, no Instituto de Biologia Molecular e Celular, num percurso do qual me orgulho muito e que se revelou muito importante para a minha carreira. Depois, tive oportunidade de continuar a minha carreira fora do país, mas o desafio do Laboratório, na minha terra natal, foi mais forte e optei por regressar a “casa”.
GCAC - Qual é a vocação do Laboratório da Paisagem?
CR - O Laboratório da Paisagem assume a sua vocação de Centro de Investigação e Educação Ambiental, aliás como está classificado pela Agência Nacional de Inovação. Apostar na investigação científica, aplicada ao território e aos seus principais desafios, e na educação para a sustentabilidade, são os nossos principais objetivos.
GCAC - Que serviços e atividades o Laboratório da Paisagem oferece?
CR - Através do programa de Educação Ambiental PEGADAS e através de um vasto portfólio de atividades de educação e sensibilização ambiental, proporcionamos um conjunto de atividades que abordam os indicadores de sustentabilidade, direcionadas para as diferentes faixas etárias. Atividades essas que têm como objetivo contribuir para a sensibilização ambiental, mas também para um contacto mais direto com a investigação.
GCAC - Que projetos promove?
CR - Dentro das áreas da natureza e biodiversidade, recursos hídricos, economia circular e paisagem e território, desenvolvemos diversos projetos que procuram contribuir para a construção de territórios mais resilientes e ambientalmente mais sustentáveis. Projetos que intentam proteger e promover a nossa biodiversidade, seja através da reabilitação dos nossos corredores verdes e azuis, de projetos que promovam a economia circular e estudem o impacte dos microplásticos nas nossas linhas de água, ou mesmo projetos que procuram promover o turismo sustentável nas cidades.
GCAC - Que atividades gostariam de realçar que tenham desenvolvido, até agora, dirigidas às crianças?
CR - É sempre difícil destacar apenas uma atividade e, por isso, destacaria o programa de Educação Ambiental PEGADAS como um todo, numa iniciativa lançada pela Câmara Municipal de Guimarães e pelos pelouros da Educação e Ambiente, há cinco anos. O Laboratório da Paisagem tem assumido a sua coordenação e dinamização, sendo hoje um programa reconhecido como uma boa prática quer a nível nacional, quer a nível internacional. Seja como for, dentro das diversas atividades que proporciona, creio que seremos tentados a sublinhar a importância do EcoParlamento, como uma atividade âncora deste programa e que tem como objetivo trazer os jovens para a discussão e debate dos principais desafios ambientais com que se deparam.
GCAC - É possível avaliar o impacto da existência desta estrutura para o território vimaranense? Ou seja, há um antes e um depois em matéria de políticas e ações ambientais desde que o Laboratório existe?
CR - É possível e é o que procuramos fazer através de diferentes instrumentos de monitorização, aliás como o comprovará o novo inquérito de perceção que será divulgado a breve trecho. Mas mais do que o impacto provocado pelo Laboratório, creio que o que se deve sublinhar é o impacto deste Ecossistema de Governança que foi iniciado em 2014 pelo Município de Guimarães e pelo seu executivo. Um rasgo que permitiu que tenhamos hoje um território conhecido e reconhecido pelas suas práticas ambientais, capaz de envolver os cidadãos, de os tornar mais exigentes e críticos. E esse antes e depois, pode ser constatado pela resposta e envolvimento dos cidadãos às iniciativas que são lançadas, inclusive através de grupos informais como as Brigadas Verdes.
GCAC - Que balanço fazem do impacto da vossa atividade, em particular, na vida das crianças?
CR - É um balanço extremamente positivo, graças a uma equipa jovem, dinâmica, que tenta, diariamente, acrescentar conhecimento aos mais novos. Se queremos transformar os cidadãos, temos de ter uma aposta forte da Educação Ambiental, contribuindo para que consigamos criar gerações mais formadas e conscientes.
GCAC - Quais são as mais recentes novidades que queiram divulgar?
CR - Convido a que todos estejam atentos aos projetos que vamos lançando e, principalmente, as iniciativas onde o envolvimento dos cidadãos é essencial. A próxima será a Festa da Primavera, já no próximo mês de março.
GCAC - Na sua opinião, qual é a importância do programa Guimarães, Cidade Amiga das Crianças da UNICEF?
CR - Diria que esta resposta, estará muito na linha daquilo que já tive oportunidade de dizer. Sabermos empoderar as crianças, educá-las, envolvê-las, é fundamental para que sejamos capazes de construir gerações mais exigentes e capazes. As cidades do futuro não se constroem apesar das pessoas, mas sim com as pessoas. E nesse capítulo, é fundamental que as ações, as atividades, os projetos que desenvolvemos, promovam o envolvimento das crianças e a sua visão para uma cidade que será delas, e adaptada aos seus desafios.
GCAC - E do empenho de Guimarães com o compromisso de ser uma Cidade Amiga das Crianças?
CR - O trajeto que Guimarães tem feito deixa claro que é um território de ciência e educação, que dá cada vez mais importância a um modelo de governança que olha para os cidadãos como “atores” centrais para o desenvolvimento do concelho. Reconhecer a importância dos jovens na discussão do futuro das cidades, dos territórios, procurar defender e promover os direitos das crianças, será fundamental para conseguirmos evoluir como sociedade.
GCAC - Quais são as expetativas do Laboratório da Paisagem e do Carlos em relação a este programa?
CR - O Laboratório da Paisagem tem tido uma atenção particular ao público mais jovem, quer na criação de momentos de partilha e discussão, quer de empoderamento. A resposta que sentimos dos mais jovens, e que em particular os nossos técnicos e investigadores sentem, é um sinal claro de que vale a pena apostar num modelo de governança participativo, em que as crianças também tenham um papel claro e objetivo. Por isso, creio será fácil de perceber que acreditamos, convictamente, que este projeto será fundamental para Guimarães, enquanto território.
GCAC - Qual a importância da aposta num território amigo das crianças?
CR - Creio que já fui respondendo a esta questão. Um território amigo das crianças, é um território que assenta a construção do seu futuro, no envolvimento daqueles que serão o nosso futuro. Um território que promove a cooperação entre instituições, sempre em prol dos cidadãos e do seu bem-estar.
GCAC - Como se consegue estimular a sensibilização das crianças em relação ao meio ambiente? Fazem falta mais “Gretas Thunbergs”?
CR - Pessoalmente, prefiro dizer que o que falta são oportunidades para os jovens assumirem um papel mais interventivo. Falta estimulá-los à participação cívica. É aliás, o que procuramos através de projetos como o EcoParlamento, de que falei anteriormente, ou d’ “O Ave Para Todos”. Se conseguirmos demonstrar aos jovens a importância da sua atuação, ou até se conseguirmos, de forma cada vez mais frequente, incluir nos programas das Escolas estes momentos de empoderamento e participação cívica, estaremos mais perto de conseguir mais crianças com uma presença mais ativa nestas discussões.
GCAC - Quais são as expetativas do Carlos em relação ao futuro das crianças do município e do país?
CR - Acredito muito nas novas gerações. As crianças têm hoje acesso a muita informação e, se souberem usá-la da melhor forma, serão jovens e adultos ainda mais qualificados e exigentes do que os de hoje. Em Guimarães, é notório o trabalho que se procura fazer com as crianças e, por isso, creio que podemos e devemos estar otimistas.
GCAC - As alterações climáticas são um dos assuntos da atualidade que gera preocupações a nível mundial. O que falta fazer para inverter a situação rapidamente? A nível local, como se alinham organizações como o Laboratório com a implementação no terreno das medidas necessárias?
CR - Falta reconhecermos que não há tempo a perder, falta que alguns países assumam as suas responsabilidades e falta até que cidades que apresentam trabalho nesta área sejam mais reconhecidas pelo seu trabalho. O papel das cidades é hoje determinante na transformação das sociedades. No Laboratório da Paisagem, quer na educação ambiental, quer na investigação, procuramos contribuir para esta mudança, percebendo que quanto maior for o conhecimento do território, mais fácil é para os decisores perceberem o caminho a percorrer.
GCAC - O que é mais difícil de mudar? A mentalidade dos adultos ou das crianças?
CR - Os adultos são mais avessos às mudanças, mas eu preferia dizer que o mais importante é concentrarmo-nos na mensagem e na explicação da necessidade para mudarmos. Se conseguirmos isto, estaremos mais próximos de mudar, sejam adultos ou crianças. Agora, é evidente que contamos muito com as crianças, não só para mudarem, mas para ajudarem na mudança, inclusive dos próprios pais.
GCAC - Se nada for feito, o futuro das próximas gerações fica comprometido... Não há como contornar esta preocupação no Plano de uma Cidade Amiga das Crianças...Aliás, pode-se afirmar que uma Cidade Amiga das Crianças tem, obrigatoriamente, que ter uma preocupação central com o meio ambiente, certo?
CR - Uma cidade amiga das crianças é uma cidade que oferece as melhores condições para os seus cidadãos viverem. Por isso, é obrigatório dizer-se que uma cidade amiga das crianças, é uma cidade que cresce assente num desenvolvimento sustentável, que se preocupa com o património natural, com a qualidade do ar, da acústica, dos recursos hídricos, que promove a economia circular ou a biodiversidade.
GCAC - Como vão ser as novas cidades amigas das crianças… e sustentáveis?
CR - Vão ser cidades como Guimarães quer ser e está a fazer por ser.